Caros bloguistas, não faço ideia! Ando à procura de resposta, como toda a gente que pensa nisto, acho eu. Encontrei dois exemplos giros de procura, que colocarei aqui. O primeiro, de Virgílio Ferreira, do livro Pensar, encontrei-o num manual de Filosofia e adorei, porque me apareceu numa altura em que andavam a mandar-me um lixo para a cabeça chamado "O Segredo" e mais a Filosofia Fish e as baboseiras ridículas do Life Training. Aqui vai:
"Olha a vida e sorri. E não te perguntes para quê. porque o mais extraordinário dela é justamente não ter para quê. Saber para quê é dar-lhe uma finalidade conclusa, limitá-la, fechar-lhe o seu excesso. Pensa assim que o seu absurdo é a sua maior razão. Não sejas contabilista, utilitarista burguês. Não desvaries em palhaçada, que é ainda uma forma de te doeres com ela. A gratuidade de uma oferta não é a sua maior valia? A vida não se te dá como uma esmola de senhora caritativa. (...) A vida dá-se-te espontaneamente, sem razão alguma para esse dar. Não queiras inventar uma razão para a razão nenhuma disso. Haverá uma ordem no infinito, não a penses agora. Porque pensar nela é ainda achar uma razão. (...) Houve o milagre do teu encontro e é tudo."
O segundo é uma peça de teatro do grande José de Almada Negreiros Poeta d'Orpheu Futurista e Tudo, que encontrei numa edição fac-similada da revista Athena, denominada "Pierrot e Arlequim" - as duas personagens da comedia del arte, com ideias completamente contrárias. Não a posso colocar aqui, na íntegra, mas procurem-na, que vale muito a pena.
Basicamente, Pierrot não faz nada, é um triste, sabe a coisa que o fará alegre, mas não a consegue alcançar. Arlequim faz tudo quanto há, é um alegre que procura não sabe o quê, mas que procura na mesma e, como não encontra, é tão triste quanto Pierrot. Arlequim diz que alegria é andar à procura de alegria e Pierrot diz que alegria é já não ter que andar à procura dela. Pierrot é indolente, Arlequim ri e chora.
Ambos morrem, ambos não casam e, no caixão, há o diálogo final: Arlequim diz que teve a melhor ideia de sempre e que vai mudar o mundo com essa ideia; Pierrot diz que teve uma ideia ainda melhor; não conseguem valorar a ideia e Pierrot convence Arlequim a dizer a sua primeiro - "A minha ideia é que não digas a tua ideia"; Arlequim pergunta porquê e Pierrot fala-lhe da ironia de ter feito tanto e de não ter concretizado a melhor das ideias e que agora era tarde para o fazer; Arlequim diz que era mesmo uma grande ideia e Pierrot acredita e ambos acham que é tarde para fazer seja o que for.
Eu cá gosto mais da busca de Arlequim, embora saiba que vai dar ao mesmo... E vossas mercês?
sábado, 20 de setembro de 2008
domingo, 7 de setembro de 2008
Eternidade ou finitude?
Finalmente, aqui venho tratar da questão mais difícil.
Pegando nas conclusões anteriores, em relação ao Amor (ou Deus), tentarei justificar a existência duma eternidade, embora com uma finitude. Aviso desde já que isto é fruto duma reflexão pessoal e duma crença, ou seja, quem não achar que o Amor seja o porque sim significante de tudo, não vai gostar desta ideia. Prossiga a marcha.
Como já disse, todos nós temos vontade, liberdade determinada pelo acaso e/ou pelo amor e somos seres com relações de interdependência estabelecida com o meio. Agora, vendo bem, a única coisa contra-natura no Mundo é o Homem e a natureza parece que, porque sim, corre direitinha e equilibrada, não fôramos nós estar aqui. Assim, poder-se-ia pensar que talvez a natureza estivesse regida por uma só vontade, como se todos os seres vivos e o meio que os criou e que os sustenta e que os transforma, fossem vários corpos, mas apenas um Ser. E porque não? Este porque sim natural não poderá constituir um Ser, ou seja, um só Amor, um só Deus? Isto é uma visão um pouco panteísta do cristianismo, mas já vou desenvolver.
O que quero dizer é que está à vista de todos que há algo que une o Universo e o seu curso, há algo que nos mostra a nossa pequenez ao tentar perceber como é possível, com tantos acasos, estarmos aqui, Homens, autênticos semi-deuses, porque criadores e portadores de vontade independente. Há uma força unificadora, chamemos-lhe assim, do espaço, de Tudo, e para que tudo parece caminhar. Essa força unificadora, tal como a palavra indica, não poderá ser a unificação de todos os seres (corpo e alma)? Por outras palavras, não caminhamos todos para um Ser? Corporalmente - mortos, seremos parte da natureza e a matéria/energia do nosso corpo será totalmente reaproveitada por animais, fungos, bactérias, plantas,...
Espiritualmente - será que, assim tão unidos ao meio não passaremos a ser parte integrante desse porque sim a que chamo Deus? Isto é, não passaremos a fazer parte desse Ser gigante, com apenas uma vontade, sem limites espaciais ou temporais, pois está em Tudo? Pensemos bem: o que une os seres humanos em comunidade? Não pode ser apenas um acesso de líbido, pois se fosse apenas isso, não teríamos necessidade de comunicar, isto é, viver em comunhão. Assim, tem que haver algo que nos une e nos obriga a comunicar, a responsabilizar-nos por outros, a afastar o egoísmo em prole duma vontade comum. Se todos fossem dotados da mesma vontade, atingir-se-ia a total união, a verdadeira comunhão. Logo, é esse o propósito para que caminhamos - unir tudo, implicando isto avanços e recuos, vitórias de egoísmos e vitórias de amores (e sim, até homens como o Hitler tinham a necessidade de comunicar, de pôr em comum).
Assim, não pode o Amor ser um Ser sem limites físicos e que, por isso, habita em nós e, mais ainda, habita em tudo o que nos rodeia?
Chegando à eternidade, apliquemos-lhe estas ideias.
Morto eu, o meu corpo alimentará outros tantos corpos e, assim, a minha "energia vital" vai estar, SEM LIMITES CORPORAIS, distribuida por uma multiplicidade de seres e, por sua vez, já é fruto duma multiplicidade de seres anteriores. Não será essa ligação tão infinita e inacabável um ser apenas, sem qualquer limite temporal, ou, por outras palavras, uma eternidade?
Na minha cabeça faz todo o sentido que seja.
Ao mesmo tempo, morta a minha alma, as minhas memórias, a minha vontade, o que resta senão unir-me à comunhão final, à vontade una e eterna que parece ligar tudo a que chamo o porque sim? Isso não será porventura a comunhão com Deus? Com o Amor? Isso não será porventura a eternidade? O Céu, vá, dito duma forma bíblica.
Por hoje, fico-me com isto, mas ainda falta justificar, então, a razão pela qual há no Universo o Homem (e talvez outros seres dotados de vontade e ego [autonomia]), único ser contra-natura, desestabilizador desta eternidade. Porque existimos, então? Porque razão ainda não somos totalmente esse Ser, essa eternidade absoluta? Para quê a vida, então?
Fica para uma próxima, senão isto ficaria muito denso...
Pegando nas conclusões anteriores, em relação ao Amor (ou Deus), tentarei justificar a existência duma eternidade, embora com uma finitude. Aviso desde já que isto é fruto duma reflexão pessoal e duma crença, ou seja, quem não achar que o Amor seja o porque sim significante de tudo, não vai gostar desta ideia. Prossiga a marcha.
Como já disse, todos nós temos vontade, liberdade determinada pelo acaso e/ou pelo amor e somos seres com relações de interdependência estabelecida com o meio. Agora, vendo bem, a única coisa contra-natura no Mundo é o Homem e a natureza parece que, porque sim, corre direitinha e equilibrada, não fôramos nós estar aqui. Assim, poder-se-ia pensar que talvez a natureza estivesse regida por uma só vontade, como se todos os seres vivos e o meio que os criou e que os sustenta e que os transforma, fossem vários corpos, mas apenas um Ser. E porque não? Este porque sim natural não poderá constituir um Ser, ou seja, um só Amor, um só Deus? Isto é uma visão um pouco panteísta do cristianismo, mas já vou desenvolver.
O que quero dizer é que está à vista de todos que há algo que une o Universo e o seu curso, há algo que nos mostra a nossa pequenez ao tentar perceber como é possível, com tantos acasos, estarmos aqui, Homens, autênticos semi-deuses, porque criadores e portadores de vontade independente. Há uma força unificadora, chamemos-lhe assim, do espaço, de Tudo, e para que tudo parece caminhar. Essa força unificadora, tal como a palavra indica, não poderá ser a unificação de todos os seres (corpo e alma)? Por outras palavras, não caminhamos todos para um Ser? Corporalmente - mortos, seremos parte da natureza e a matéria/energia do nosso corpo será totalmente reaproveitada por animais, fungos, bactérias, plantas,...
Espiritualmente - será que, assim tão unidos ao meio não passaremos a ser parte integrante desse porque sim a que chamo Deus? Isto é, não passaremos a fazer parte desse Ser gigante, com apenas uma vontade, sem limites espaciais ou temporais, pois está em Tudo? Pensemos bem: o que une os seres humanos em comunidade? Não pode ser apenas um acesso de líbido, pois se fosse apenas isso, não teríamos necessidade de comunicar, isto é, viver em comunhão. Assim, tem que haver algo que nos une e nos obriga a comunicar, a responsabilizar-nos por outros, a afastar o egoísmo em prole duma vontade comum. Se todos fossem dotados da mesma vontade, atingir-se-ia a total união, a verdadeira comunhão. Logo, é esse o propósito para que caminhamos - unir tudo, implicando isto avanços e recuos, vitórias de egoísmos e vitórias de amores (e sim, até homens como o Hitler tinham a necessidade de comunicar, de pôr em comum).
Assim, não pode o Amor ser um Ser sem limites físicos e que, por isso, habita em nós e, mais ainda, habita em tudo o que nos rodeia?
Chegando à eternidade, apliquemos-lhe estas ideias.
Morto eu, o meu corpo alimentará outros tantos corpos e, assim, a minha "energia vital" vai estar, SEM LIMITES CORPORAIS, distribuida por uma multiplicidade de seres e, por sua vez, já é fruto duma multiplicidade de seres anteriores. Não será essa ligação tão infinita e inacabável um ser apenas, sem qualquer limite temporal, ou, por outras palavras, uma eternidade?
Na minha cabeça faz todo o sentido que seja.
Ao mesmo tempo, morta a minha alma, as minhas memórias, a minha vontade, o que resta senão unir-me à comunhão final, à vontade una e eterna que parece ligar tudo a que chamo o porque sim? Isso não será porventura a comunhão com Deus? Com o Amor? Isso não será porventura a eternidade? O Céu, vá, dito duma forma bíblica.
Por hoje, fico-me com isto, mas ainda falta justificar, então, a razão pela qual há no Universo o Homem (e talvez outros seres dotados de vontade e ego [autonomia]), único ser contra-natura, desestabilizador desta eternidade. Porque existimos, então? Porque razão ainda não somos totalmente esse Ser, essa eternidade absoluta? Para quê a vida, então?
Fica para uma próxima, senão isto ficaria muito denso...
quarta-feira, 6 de agosto de 2008
Amor Vs. Hábito 2
Depois de unir o Amor ao hábito determinado, que, esqueci-me de mencionar, neste caso deve ser desinteressado, falta justificar esse mesmo hábito. Porque razão criamos uns hábitos e não outros?
Por Amor, poderia eu responder, e a resposta andava como um cão atrás da cauda. De certa forma, acredito que isto esteja certo, mas não constitui a totalidade da resposta. Quando digo por Amor, e aqui tomamos Amor no seu sentido lato, isto é, todos os laços que constituam uma relação de respeito, compromisso e afectividade (amizade faz, obviamente, parte do bolo), será o mesmo que dizer porque sim, ou por acaso, já que Amor é um absurdo para uma mente determinada por corpo, espaço, tempo, finitude e lógica e, assim, tudo o que é contrário a estas muralhas só pode ser metafísico ou, por palavras dum crente, transcendental. Assim, os únicos sentimentos válidos são o Amor e a Ausência de Amor (egoísmo ou solidão) - tudo o resto a que chamamos de sentimentos não passam de sensações disfarçadas de sentimento através duma atribuição racional, por parte da imaginação, duma causa a priori da sensação. Mas não nos dispersemos.
Voltando ao Amor, que será o mesmo que dizer Deus, para Cristãos, Judeus e Islamistas; que será o mesmo que dizer a energia vital do Universo; que será o mesmo que dizer o Nada ou o Nirvana; que será o mesmo que dizer Acaso, para quem não acredite, e com todo o direito, em transcendentalismos, haverá nessa escolha do hábito determinado desinteressado alguma razão senão o tal porque sim?
Freud, esse grande criador da Psicanálise, provou-o: muitas das nossas escolhas, preferências afectivas vêm dos primeiros anos de vida - inconsciente, ou semi-consciente. Na verdade (palavra horrível), o subconsciente do ser humano vai ser afectado, sobretudo, pela recepção sensitiva dos estímulos, sobretudo, da sua mãe, o que poderá parecer um pouco doentio, mas que está comprovadíssimo. O ser humano, já consciente, vai ter tendência para procurar os indivíduos com características semelhantes, ou que pelo menos criem as mesmas experiências sensitivas, às da sua mãe. Por exemplo, o desiquilíbrio emocional de Mário de Sá-Carneiro, que não consegue aproximar-se das mulheres senão em ilusão e sonhos deve-se ao facto da sua mãe ter morrido cedo (também pode acontecer o contrário: uma necessidade pungente e redobrada de afecto e sexualidade). Também no caso do sexo feminino é a mãe que vai influenciar o subconsciente da filha nas suas escolhas afectivas - procura raparigas com características semelhantes como amigas e rapazes como amigos ou algo mais do que isso. Daí se explica que mulheres mais facilmente são capazes de apreciar a beleza (seja lá o que isso for, ainda não chegámos à estética) noutras mulheres do que os homens entre si.
Contudo, estas influências de afectividade são meramente físicas e nós, dotados de razão lógica limitada de imaginação ilimitada, somos seres de vontade e, assim, voltamos ao cão atrás do rabo, voltamos ao porque sim a que chamo de Deus.
Eu amo porque amo! É o absurdo mais ilimitado do ser humano e, embora não o possa provar, é isto que constitui o Absoluto a que toda a Razão aspira mas não toca.
Por Amor, poderia eu responder, e a resposta andava como um cão atrás da cauda. De certa forma, acredito que isto esteja certo, mas não constitui a totalidade da resposta. Quando digo por Amor, e aqui tomamos Amor no seu sentido lato, isto é, todos os laços que constituam uma relação de respeito, compromisso e afectividade (amizade faz, obviamente, parte do bolo), será o mesmo que dizer porque sim, ou por acaso, já que Amor é um absurdo para uma mente determinada por corpo, espaço, tempo, finitude e lógica e, assim, tudo o que é contrário a estas muralhas só pode ser metafísico ou, por palavras dum crente, transcendental. Assim, os únicos sentimentos válidos são o Amor e a Ausência de Amor (egoísmo ou solidão) - tudo o resto a que chamamos de sentimentos não passam de sensações disfarçadas de sentimento através duma atribuição racional, por parte da imaginação, duma causa a priori da sensação. Mas não nos dispersemos.
Voltando ao Amor, que será o mesmo que dizer Deus, para Cristãos, Judeus e Islamistas; que será o mesmo que dizer a energia vital do Universo; que será o mesmo que dizer o Nada ou o Nirvana; que será o mesmo que dizer Acaso, para quem não acredite, e com todo o direito, em transcendentalismos, haverá nessa escolha do hábito determinado desinteressado alguma razão senão o tal porque sim?
Freud, esse grande criador da Psicanálise, provou-o: muitas das nossas escolhas, preferências afectivas vêm dos primeiros anos de vida - inconsciente, ou semi-consciente. Na verdade (palavra horrível), o subconsciente do ser humano vai ser afectado, sobretudo, pela recepção sensitiva dos estímulos, sobretudo, da sua mãe, o que poderá parecer um pouco doentio, mas que está comprovadíssimo. O ser humano, já consciente, vai ter tendência para procurar os indivíduos com características semelhantes, ou que pelo menos criem as mesmas experiências sensitivas, às da sua mãe. Por exemplo, o desiquilíbrio emocional de Mário de Sá-Carneiro, que não consegue aproximar-se das mulheres senão em ilusão e sonhos deve-se ao facto da sua mãe ter morrido cedo (também pode acontecer o contrário: uma necessidade pungente e redobrada de afecto e sexualidade). Também no caso do sexo feminino é a mãe que vai influenciar o subconsciente da filha nas suas escolhas afectivas - procura raparigas com características semelhantes como amigas e rapazes como amigos ou algo mais do que isso. Daí se explica que mulheres mais facilmente são capazes de apreciar a beleza (seja lá o que isso for, ainda não chegámos à estética) noutras mulheres do que os homens entre si.
Contudo, estas influências de afectividade são meramente físicas e nós, dotados de razão lógica limitada de imaginação ilimitada, somos seres de vontade e, assim, voltamos ao cão atrás do rabo, voltamos ao porque sim a que chamo de Deus.
Eu amo porque amo! É o absurdo mais ilimitado do ser humano e, embora não o possa provar, é isto que constitui o Absoluto a que toda a Razão aspira mas não toca.
domingo, 3 de agosto de 2008
Amor Vs. Hábito
Como já vimos anteriormente, "a vida não tem nexo/dar-lhe um rumo é dar-lhe um fim" (já dizia Manuel Cruz). Compreender isto é essencial para compreender a questão que vou tratar hoje: Amor vs. Hábito.
É certo e sabido que, ao habituarmo-nos às coisas, essas ganham, para nós, um valor afectivo. Contudo, será que esse valor afectivo veio da força do hábito ou foi algo de independente? A resposta, a meu ver, pode começar por aqui: é possível que um aluno tenha aulas com um professor todos os dias e que não goste dele! Mas esta questão não é assim tão simples:
Há que separar dois tipos de hábitos: os hábitos determinantes e os hábitos determinados. Os primeiros são aqueles que, pela força do acaso, nos vimos como que obrigados a abraçar, como é o caso de um aluno que vai para as aulas e dá de caras com um professor que não escolheu e de quem não gosta, nem depois de seis meses de habituação; os hábitos determinados são aqueles que, na nossa liberdade (depois de sujeita ao acaso, também, não esqueçamos), nós criamos na nossa livre vontade, como por exemplo um indivíduo que combine todas as semanas um cafezinho com um amigo específico. Como é óbvio, no segundo caso a afectividade existe sempre! No primeiro, é uma questão de acaso, embora haja, por exemplo, o lugar-comum humano do amor à família, que não é escolhida, mas onde a força do hábito foi, sem dúvida, maior do que em qualquer dos hábitos determinantes e, como a família é determinante desde a nascença dum indivíduo, este encontrar-se-à mais determinado a abraçá-la no amor e na afectividade, embora isto não seja tão linear como estou a apresentar.
Isto remete-me para o Amor, e eis aqui a minha primeira conclusão: o Amor nasce do hábito determinado, isto é, tal como a liberdade, está sujeito ao acaso, mas dentro de um vasto campo, é fruto duma escolha do indivíduo, que, assim, passa a criar um hábito e deixa de ser exactamente como um cão, já que este tem apenas os hábitos determinantes.
Deixo-vos, para já, com estes pensamentos. Até breve
Continua...
É certo e sabido que, ao habituarmo-nos às coisas, essas ganham, para nós, um valor afectivo. Contudo, será que esse valor afectivo veio da força do hábito ou foi algo de independente? A resposta, a meu ver, pode começar por aqui: é possível que um aluno tenha aulas com um professor todos os dias e que não goste dele! Mas esta questão não é assim tão simples:
Há que separar dois tipos de hábitos: os hábitos determinantes e os hábitos determinados. Os primeiros são aqueles que, pela força do acaso, nos vimos como que obrigados a abraçar, como é o caso de um aluno que vai para as aulas e dá de caras com um professor que não escolheu e de quem não gosta, nem depois de seis meses de habituação; os hábitos determinados são aqueles que, na nossa liberdade (depois de sujeita ao acaso, também, não esqueçamos), nós criamos na nossa livre vontade, como por exemplo um indivíduo que combine todas as semanas um cafezinho com um amigo específico. Como é óbvio, no segundo caso a afectividade existe sempre! No primeiro, é uma questão de acaso, embora haja, por exemplo, o lugar-comum humano do amor à família, que não é escolhida, mas onde a força do hábito foi, sem dúvida, maior do que em qualquer dos hábitos determinantes e, como a família é determinante desde a nascença dum indivíduo, este encontrar-se-à mais determinado a abraçá-la no amor e na afectividade, embora isto não seja tão linear como estou a apresentar.
Isto remete-me para o Amor, e eis aqui a minha primeira conclusão: o Amor nasce do hábito determinado, isto é, tal como a liberdade, está sujeito ao acaso, mas dentro de um vasto campo, é fruto duma escolha do indivíduo, que, assim, passa a criar um hábito e deixa de ser exactamente como um cão, já que este tem apenas os hábitos determinantes.
Deixo-vos, para já, com estes pensamentos. Até breve
Continua...
segunda-feira, 7 de julho de 2008
Absurdo, Acaso e Liberdade
Andei eu a reflectir nestas questões nestes últimos dias. Ao Sr. Anónimo, obrigado pelo hábito, que é, realmente, fulcral para a compreensão do absurdo.
Encontramo-nos, na Filosofia do Absurdo, perante três conflitos:
o acaso contra a liberdade;
a finitude contra a eternidade;
o hábito contra o amor (ou o sentimento, em geral).
Comecemos por tentar resolver o acaso. Finitude e hábito ficam para outros dias. O acaso existe? Com certeza. Estamos expostos a catástrofes naturais. A acidentes provocados por terceiros. A doenças sem cura. Em suma, não somos senhores de nós. Aliás, não somos totalmente senhores de nós, porque se o não fossemos totalmente, não existiria a responsabilidade, tão pouco a escolha. O acaso soa a natureza, mas o homem é contranatura: dentro do determinismo a que está sujeito, tem toda a liberdade de escolha, isto é, o acaso determina apenas o campo de acção em que podemos escolher e não a escolha em si. Deste modo, Mersault tinha inúmeras hipóteses no momento em que o acaso o colocou perante o árabe, com um revólver na mão, com um sol acutilante, com um torpor alucinatório da tarde: poderia ter fugido; poderia ter-se aproximado sem pensar no revólver; poderia ter disparado para o ar de modo a afugentá-lo; poderia etcetera e tal… Ele disparou, matou um ser humano e, como a base da ética é a liberdade, o seu acto foi, sem dúvida, imoral, no sentido em que usou a sua liberdade para acabar com a liberdade de outro indivíduo semelhante, sujeito ao acaso da liberdade do primeiro.
Com esta conversa toda, quero mostrar que acaso e liberdade se entrecruzam e interpenetram e fazem parte um do outro. Se não houvesse acaso, haveria liberdade? Com certeza que não, uma vez que as escolhas e os actos de cada individuo não poderiam influenciar qualquer outro indivíduo, directa ou indirectamente, sem este tomar parte nesses mesmos actos e escolhas – liberdade sem acaso é uma redundância. Acaso sem liberdade também o é, porque passaria a ser, não acaso, mas destino. (acaso é diferente de “ser natural”, é o tal “por que sim” ou “porque sim”).
Ainda assim, Mersault não poderia ser julgado tão levianamente, já que ficamos sem saber se o “homem animal” se sobrepôs ao “homem humano”, e, se assim o foi, obviamente que, aí sim, o conceito de liberdade deixaria de existir e, com ele, o de responsabilidade. Isto duma perspectiva genericamente kantiana da ética, grosso modo dizendo, onde o que conta é a intenção e não o acto e os seus efeitos.
Aqui vemos Sartre com a sua “pluralidade de verdades” – não cheguei a conclusão nenhuma nas minhas reflexões, fiquei-me pela busca. Para mim, é esta busca o suporte do sentido nenhum da existência. Eu, e muitos outros, vivemos nesta redundância ilimitada:
A EXISTÊNCIA NÂO TEM SENTIDO. O SEU SENTIDO É A BUSCA POR UM SENTIDO.
É uma questão de não impor um limite ou caminho único, mas antes uma pluralidade de caminhos, ou seja, viver o absurdo intensamente, numa busca insaciável, na qual se é extremamente feliz, por se penetrar completamente nos “gozos”, e extremamente infeliz, por se penetrar completamente nos “aborrecimentos”.
Aos que defendem a ausência de dor ou o máximo prazer como fim último, uma palavra: TÉDIO – é o que acontece aos que se guiam por um único caminho e descobrem que, por mais que tentem, um caminho não cobre tudo o que pretendem que seja a felicidade plena. É necessário haver negativo para que haja positivo, ou o positivo torna-se neutro!
Deixo-vos, aqui, um poema de Alexandre O’Neill que diz, sobretudo, isto, embora diga muito mais.
OS ATACADORES
A noiva já de noiva, a noiva já na igreja
e tu não encontras os atacadores!
Já viste na caixa dos sobejos, na mão dos bocejos?
Já viste na gaveta da cómoda?
Já viste nas pregas da imaginação?
Ganha os campos, foge, precede-te a ti mesmo
como um homem legalmente espavorido
por anos de critério,
sê repentino como um menino!
Convém-te não encontrar os atacadores?
Há noivas que esperam até murcharem as flores,
noivas de pé, muito brancas e já a fazer beicinho…
Procura… Procura sempre, pobrezinho!...
Procura mas não encontres os
atacadores…
ALEXANDRE O’NEILL, em Uma Lisboa Remanchada
Encontramo-nos, na Filosofia do Absurdo, perante três conflitos:
o acaso contra a liberdade;
a finitude contra a eternidade;
o hábito contra o amor (ou o sentimento, em geral).
Comecemos por tentar resolver o acaso. Finitude e hábito ficam para outros dias. O acaso existe? Com certeza. Estamos expostos a catástrofes naturais. A acidentes provocados por terceiros. A doenças sem cura. Em suma, não somos senhores de nós. Aliás, não somos totalmente senhores de nós, porque se o não fossemos totalmente, não existiria a responsabilidade, tão pouco a escolha. O acaso soa a natureza, mas o homem é contranatura: dentro do determinismo a que está sujeito, tem toda a liberdade de escolha, isto é, o acaso determina apenas o campo de acção em que podemos escolher e não a escolha em si. Deste modo, Mersault tinha inúmeras hipóteses no momento em que o acaso o colocou perante o árabe, com um revólver na mão, com um sol acutilante, com um torpor alucinatório da tarde: poderia ter fugido; poderia ter-se aproximado sem pensar no revólver; poderia ter disparado para o ar de modo a afugentá-lo; poderia etcetera e tal… Ele disparou, matou um ser humano e, como a base da ética é a liberdade, o seu acto foi, sem dúvida, imoral, no sentido em que usou a sua liberdade para acabar com a liberdade de outro indivíduo semelhante, sujeito ao acaso da liberdade do primeiro.
Com esta conversa toda, quero mostrar que acaso e liberdade se entrecruzam e interpenetram e fazem parte um do outro. Se não houvesse acaso, haveria liberdade? Com certeza que não, uma vez que as escolhas e os actos de cada individuo não poderiam influenciar qualquer outro indivíduo, directa ou indirectamente, sem este tomar parte nesses mesmos actos e escolhas – liberdade sem acaso é uma redundância. Acaso sem liberdade também o é, porque passaria a ser, não acaso, mas destino. (acaso é diferente de “ser natural”, é o tal “por que sim” ou “porque sim”).
Ainda assim, Mersault não poderia ser julgado tão levianamente, já que ficamos sem saber se o “homem animal” se sobrepôs ao “homem humano”, e, se assim o foi, obviamente que, aí sim, o conceito de liberdade deixaria de existir e, com ele, o de responsabilidade. Isto duma perspectiva genericamente kantiana da ética, grosso modo dizendo, onde o que conta é a intenção e não o acto e os seus efeitos.
Aqui vemos Sartre com a sua “pluralidade de verdades” – não cheguei a conclusão nenhuma nas minhas reflexões, fiquei-me pela busca. Para mim, é esta busca o suporte do sentido nenhum da existência. Eu, e muitos outros, vivemos nesta redundância ilimitada:
A EXISTÊNCIA NÂO TEM SENTIDO. O SEU SENTIDO É A BUSCA POR UM SENTIDO.
É uma questão de não impor um limite ou caminho único, mas antes uma pluralidade de caminhos, ou seja, viver o absurdo intensamente, numa busca insaciável, na qual se é extremamente feliz, por se penetrar completamente nos “gozos”, e extremamente infeliz, por se penetrar completamente nos “aborrecimentos”.
Aos que defendem a ausência de dor ou o máximo prazer como fim último, uma palavra: TÉDIO – é o que acontece aos que se guiam por um único caminho e descobrem que, por mais que tentem, um caminho não cobre tudo o que pretendem que seja a felicidade plena. É necessário haver negativo para que haja positivo, ou o positivo torna-se neutro!
Deixo-vos, aqui, um poema de Alexandre O’Neill que diz, sobretudo, isto, embora diga muito mais.
OS ATACADORES
A noiva já de noiva, a noiva já na igreja
e tu não encontras os atacadores!
Já viste na caixa dos sobejos, na mão dos bocejos?
Já viste na gaveta da cómoda?
Já viste nas pregas da imaginação?
Ganha os campos, foge, precede-te a ti mesmo
como um homem legalmente espavorido
por anos de critério,
sê repentino como um menino!
Convém-te não encontrar os atacadores?
Há noivas que esperam até murcharem as flores,
noivas de pé, muito brancas e já a fazer beicinho…
Procura… Procura sempre, pobrezinho!...
Procura mas não encontres os
atacadores…
ALEXANDRE O’NEILL, em Uma Lisboa Remanchada
quinta-feira, 3 de julho de 2008
Começar em Grande
Leitores, como desconstrutor (ou destruidor) de estabilidades, cá estou eu, com a minha espada chamada Filosofia, para destruir o pus e a pústula, chamados Verdade e Certeza.
Não sou um grande estudioso nem um grande sabedor. A Filosofia que aqui vou apresentar não será a do filósofo (a formal, por assim dizer), mas antes a latente das letras e da teologia, que contêm os melhores trechos de Filosofia e, em simultâneo, de Arte.
Debruçar-me-ei, sobretudo, na tríade do Sentido da Existência, isto é, Metafísica, Ética e Ontologia, e na Estética, tão essencial quanto as outras e tão intrinsecamente ligada a elas.
Abomino construções de estruturas mentais e psicológicas, por constituirem um limite imposto pela nossa capacidade ilimitada de pensar (ou de sentir, que são, já nos dizia o grande destruidor de almas Fernando Pessoa, a mesma coisa [já lá vamos um dia destes]).
No fundo,
ABAIXO PLATÃO
VIVA OS SOFISTAS!
Para começarmos numa fusão nuclear, que tal um quase-niilismo camusiano?
"Não há factos eternos, como não há verdades absolutas.", esse grande desconstrutor que foi Nietzsche já no-lo dizia. Aproveito a deixa para introduzir aqui esse clássico da literatura que é "O Estrangeiro" do shor Alberto - as estrondosas frases curtas (meio neo-realistas), a compassar musicalmente o absurdo de cada instante, que não passa dum instante nunca penetrado, nunca compreendido a fundo, apenas gozado ou por gozar; o ridículo dos afazeres quotidianos; o mais assustador: a hierarquização desierarquizada desses instantes: o calor tão importante como a morte da mãe; o sentido nenhum da palavra amor. Aliás, nada mais há do que gozos, aborrecimentos, memórias que dão gozo e memórias que dão aborrecimento...
Sim, esse "inocente", esse "maluco", que o protagonista Mersault parece ser, entra em cada leitor e diz-lhe: "Tás a ver? A vida é para encher chouriços. Que tem arranjar uma gaja boa no dia seguinte ao enterro da minha mãe onde não sofri nem um pouco, tirando os «aborrecimentos» de aturar uns velhadas e um calor insuportável por mera convenção e obrigação social? Tudo é efémero, para quê o remorso se o acaso existe? Serei um criador de desumanidade por matar por acaso? Por uma morte dum parente não me induzir dor por acaso? Por ter um revólver dum amigo chamado Raimundo no bolso por acaso?"
Para a personagem de Camus, é assim, nada é bom nem mau: tudo é natural.
Para mim, o acaso significa o mesmo do que "por que sim"...
ACASO E EFEMERIDADE DESTROEM OS CONCEITOS DE BEM E DE MAL?
HÁ MORALIDADE E IMORALIDADE OU APENAS O ACASO?
FAZ SENTIDO A VIDA OU É ABSURDA?
Jean-Paul Sartre fala de "pluralismo irredutível das verdades", de "finitude"...
Deixo isto assim, no ar, a marinar nas vossas cabeças pensantes, esperando os jeitosos dos feedbacks em comentários.
Aconselho, para o tema:
Nietzsche - O Anti-Cristo (entre outros)
Poesias Completas de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa, com Álvaro de Campos, é o verdadeiro criador da Filosofia do Absurdo, embora nunca chegasse a dar-lhe um nome)
Albert Camus - O Mito de Sísifo (teorização filosófica do seu "romance" O Estrangeiro, digamos assim)
Não sou um grande estudioso nem um grande sabedor. A Filosofia que aqui vou apresentar não será a do filósofo (a formal, por assim dizer), mas antes a latente das letras e da teologia, que contêm os melhores trechos de Filosofia e, em simultâneo, de Arte.
Debruçar-me-ei, sobretudo, na tríade do Sentido da Existência, isto é, Metafísica, Ética e Ontologia, e na Estética, tão essencial quanto as outras e tão intrinsecamente ligada a elas.
Abomino construções de estruturas mentais e psicológicas, por constituirem um limite imposto pela nossa capacidade ilimitada de pensar (ou de sentir, que são, já nos dizia o grande destruidor de almas Fernando Pessoa, a mesma coisa [já lá vamos um dia destes]).
No fundo,
ABAIXO PLATÃO
VIVA OS SOFISTAS!
Para começarmos numa fusão nuclear, que tal um quase-niilismo camusiano?
"Não há factos eternos, como não há verdades absolutas.", esse grande desconstrutor que foi Nietzsche já no-lo dizia. Aproveito a deixa para introduzir aqui esse clássico da literatura que é "O Estrangeiro" do shor Alberto - as estrondosas frases curtas (meio neo-realistas), a compassar musicalmente o absurdo de cada instante, que não passa dum instante nunca penetrado, nunca compreendido a fundo, apenas gozado ou por gozar; o ridículo dos afazeres quotidianos; o mais assustador: a hierarquização desierarquizada desses instantes: o calor tão importante como a morte da mãe; o sentido nenhum da palavra amor. Aliás, nada mais há do que gozos, aborrecimentos, memórias que dão gozo e memórias que dão aborrecimento...
Sim, esse "inocente", esse "maluco", que o protagonista Mersault parece ser, entra em cada leitor e diz-lhe: "Tás a ver? A vida é para encher chouriços. Que tem arranjar uma gaja boa no dia seguinte ao enterro da minha mãe onde não sofri nem um pouco, tirando os «aborrecimentos» de aturar uns velhadas e um calor insuportável por mera convenção e obrigação social? Tudo é efémero, para quê o remorso se o acaso existe? Serei um criador de desumanidade por matar por acaso? Por uma morte dum parente não me induzir dor por acaso? Por ter um revólver dum amigo chamado Raimundo no bolso por acaso?"
Para a personagem de Camus, é assim, nada é bom nem mau: tudo é natural.
Para mim, o acaso significa o mesmo do que "por que sim"...
ACASO E EFEMERIDADE DESTROEM OS CONCEITOS DE BEM E DE MAL?
HÁ MORALIDADE E IMORALIDADE OU APENAS O ACASO?
FAZ SENTIDO A VIDA OU É ABSURDA?
Jean-Paul Sartre fala de "pluralismo irredutível das verdades", de "finitude"...
Deixo isto assim, no ar, a marinar nas vossas cabeças pensantes, esperando os jeitosos dos feedbacks em comentários.
Aconselho, para o tema:
Nietzsche - O Anti-Cristo (entre outros)
Poesias Completas de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa, com Álvaro de Campos, é o verdadeiro criador da Filosofia do Absurdo, embora nunca chegasse a dar-lhe um nome)
Albert Camus - O Mito de Sísifo (teorização filosófica do seu "romance" O Estrangeiro, digamos assim)
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