quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Amor Vs. Hábito 2

Depois de unir o Amor ao hábito determinado, que, esqueci-me de mencionar, neste caso deve ser desinteressado, falta justificar esse mesmo hábito. Porque razão criamos uns hábitos e não outros?
Por Amor, poderia eu responder, e a resposta andava como um cão atrás da cauda. De certa forma, acredito que isto esteja certo, mas não constitui a totalidade da resposta. Quando digo por Amor, e aqui tomamos Amor no seu sentido lato, isto é, todos os laços que constituam uma relação de respeito, compromisso e afectividade (amizade faz, obviamente, parte do bolo), será o mesmo que dizer porque sim, ou por acaso, já que Amor é um absurdo para uma mente determinada por corpo, espaço, tempo, finitude e lógica e, assim, tudo o que é contrário a estas muralhas só pode ser metafísico ou, por palavras dum crente, transcendental. Assim, os únicos sentimentos válidos são o Amor e a Ausência de Amor (egoísmo ou solidão) - tudo o resto a que chamamos de sentimentos não passam de sensações disfarçadas de sentimento através duma atribuição racional, por parte da imaginação, duma causa a priori da sensação. Mas não nos dispersemos.
Voltando ao Amor, que será o mesmo que dizer Deus, para Cristãos, Judeus e Islamistas; que será o mesmo que dizer a energia vital do Universo; que será o mesmo que dizer o Nada ou o Nirvana; que será o mesmo que dizer Acaso, para quem não acredite, e com todo o direito, em transcendentalismos, haverá nessa escolha do hábito determinado desinteressado alguma razão senão o tal porque sim?
Freud, esse grande criador da Psicanálise, provou-o: muitas das nossas escolhas, preferências afectivas vêm dos primeiros anos de vida - inconsciente, ou semi-consciente. Na verdade (palavra horrível), o subconsciente do ser humano vai ser afectado, sobretudo, pela recepção sensitiva dos estímulos, sobretudo, da sua mãe, o que poderá parecer um pouco doentio, mas que está comprovadíssimo. O ser humano, já consciente, vai ter tendência para procurar os indivíduos com características semelhantes, ou que pelo menos criem as mesmas experiências sensitivas, às da sua mãe. Por exemplo, o desiquilíbrio emocional de Mário de Sá-Carneiro, que não consegue aproximar-se das mulheres senão em ilusão e sonhos deve-se ao facto da sua mãe ter morrido cedo (também pode acontecer o contrário: uma necessidade pungente e redobrada de afecto e sexualidade). Também no caso do sexo feminino é a mãe que vai influenciar o subconsciente da filha nas suas escolhas afectivas - procura raparigas com características semelhantes como amigas e rapazes como amigos ou algo mais do que isso. Daí se explica que mulheres mais facilmente são capazes de apreciar a beleza (seja lá o que isso for, ainda não chegámos à estética) noutras mulheres do que os homens entre si.
Contudo, estas influências de afectividade são meramente físicas e nós, dotados de razão lógica limitada de imaginação ilimitada, somos seres de vontade e, assim, voltamos ao cão atrás do rabo, voltamos ao porque sim a que chamo de Deus.

Eu amo porque amo! É o absurdo mais ilimitado do ser humano e, embora não o possa provar, é isto que constitui o Absoluto a que toda a Razão aspira mas não toca.

domingo, 3 de agosto de 2008

Amor Vs. Hábito

Como já vimos anteriormente, "a vida não tem nexo/dar-lhe um rumo é dar-lhe um fim" (já dizia Manuel Cruz). Compreender isto é essencial para compreender a questão que vou tratar hoje: Amor vs. Hábito.

É certo e sabido que, ao habituarmo-nos às coisas, essas ganham, para nós, um valor afectivo. Contudo, será que esse valor afectivo veio da força do hábito ou foi algo de independente? A resposta, a meu ver, pode começar por aqui: é possível que um aluno tenha aulas com um professor todos os dias e que não goste dele! Mas esta questão não é assim tão simples:

Há que separar dois tipos de hábitos: os hábitos determinantes e os hábitos determinados. Os primeiros são aqueles que, pela força do acaso, nos vimos como que obrigados a abraçar, como é o caso de um aluno que vai para as aulas e dá de caras com um professor que não escolheu e de quem não gosta, nem depois de seis meses de habituação; os hábitos determinados são aqueles que, na nossa liberdade (depois de sujeita ao acaso, também, não esqueçamos), nós criamos na nossa livre vontade, como por exemplo um indivíduo que combine todas as semanas um cafezinho com um amigo específico. Como é óbvio, no segundo caso a afectividade existe sempre! No primeiro, é uma questão de acaso, embora haja, por exemplo, o lugar-comum humano do amor à família, que não é escolhida, mas onde a força do hábito foi, sem dúvida, maior do que em qualquer dos hábitos determinantes e, como a família é determinante desde a nascença dum indivíduo, este encontrar-se-à mais determinado a abraçá-la no amor e na afectividade, embora isto não seja tão linear como estou a apresentar.

Isto remete-me para o Amor, e eis aqui a minha primeira conclusão: o Amor nasce do hábito determinado, isto é, tal como a liberdade, está sujeito ao acaso, mas dentro de um vasto campo, é fruto duma escolha do indivíduo, que, assim, passa a criar um hábito e deixa de ser exactamente como um cão, já que este tem apenas os hábitos determinantes.



Deixo-vos, para já, com estes pensamentos. Até breve

Continua...